sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

Perguntas e Repostas


4. Que significado tem a virgindade de Maria?

Que Maria concebeu Jesus sem intervenção de varão é afirmado claramente nos dois primeiros capítulos dos evangelhos de S. Mateus e de S. Lucas: “ o que nela foi concebido é obra do Espírito Santo”, diz o anjo a S. José (Mt 1, 20); e a Maria que pergunta “ Como se fará isso, pois eu não conheço homem?” o anjo responde-lhe: “ O Espírito Santo descerá sobre ti e a virtude do Altíssimo te cobrirá com a Sua sombra...”
(Lc 1, 34-35). Por outro lado, o facto de Jesus confiar a sua Mãe a S. João, quando está na Cruz, pressupõe que a Virgem não tivesse outros filhos. Que nos evangelhos se mencionem por vezes os “irmãos de Jesus”, pode explicar-se pelo uso do termo “irmãos” em hebreu no sentido de parentes próximos (Gn 13, 8; etc.); ou pensando que S. José tinha filhos de um matrimónio anterior; ou usando o termo em sentido de membro do grupo de crentes tal como se usa no Novo Testamento (Act 1, 15). A igreja sempre acreditou na virgindade de Maria e chamou-a “a sempre virgem” (Lumen Gentium 52), quer dizer, antes, durante e depois do parto, como confessa uma fórmula tradicional.

A concepção virginal de Jesus deve ser entendida como uma obra do poder de Deus – “porque a Deus nada é impossível” (Lc 1, 37) – que escapa a toda compreensão e a qualquer possibilidade humanas. Nada tem a ver com as representações mitológicas pagãs nas quais um deus se une a uma mulher fazendo as vezes do varão. A concepção virginal de Jesus trata-se de uma obra divina no seio de Maria semelhante à criação. Isto é impossível de aceitar para o não crente, tal como o era para os judeus e para os pagãos, entre os quais se inventaram toscas histórias acerca da concepção de Jesus, como a que a atribui a um soldado romano chamado Pantheras. Na realidade, esse personagem é uma ficção literária sobre a qual se inventa uma lenda para fazer troça dos cristãos. Do ponto de vista da ciência histórica e filológica, o nome Pantheras (ou Pandera) é uma paródia viciada da palavra parthénos (que em grego significa virgem). Aqueles povos, que utilizavam o grego como língua de comunicação em grande parte do império romano de oriente, ouviam os cristãos falar de Jesus como do Filho da Virgem (huiós parthénou), e quando queriam troçar deles chamavam-no «o filho de Pantheras». Tais histórias, ao fim e ao cabo, apenas testemunham que a Igreja acreditava na virgindade de Maria, ainda que parecesse impossível.

A concepção virginal de Jesus é um sinal de que Jesus é verdadeiramente Filho de Deus por natureza – daí que não tenha um pai humano – ao mesmo tempo que é verdadeiro homem nascido de uma mulher (Gl 4, 4). Nas passagens evangélicas mostra‑se a absoluta iniciativa de Deus na história humana para nos obter a vinda da salvação, e que esta se insere na própria história, como mostram as genealogias de Jesus.

Jesus, concebido pelo Espírito Santo e sem cooperação de varão, pode ser melhor compreendido como o novo Adão, que inaugura uma nova criação à qual pertence o homem novo redimido por Ele (1 Cor 15, 47; Jo 3, 34).

A virgindade de Maria é além disso sinal da sua fé sem sombra de qualquer dúvida, e da sua entrega plena à vontade de Deus. Inclusivamente se diz que por essa fé, Maria concebe Cristo antes na sua mente que no seu ventre, e que “é mais bem aventurada ao receber Cristo pela fé, que ao conceber no seu seio a carne de Cristo” (Santo Agostinho). Sendo virgem e mãe, Maria é também figura a Igreja e a sua mais perfeita realização.


Bibliografia: Catecismo da Igreja Católica, nn. 484-511; Francisco Varo, Rabí Jesús de Nazaret, BAC, Madrid 2005 (págs. 212-219).

5. São José esteve casado por segunda vez?

Segundo S. Mateus, quando a Santíssima Virgem concebeu virginalmente Jesus, estava desposada com São José embora ainda não vivessem juntos (Mt 1, 18). Tratava-se da situação prévia aos desposórios que, entre os judeus, suponha um compromisso tão forte e real, que os comprometidos podiam ser já chamados esposo e esposa, e que só podia ser anulado mediante o repúdio. Do texto de S. Mateus deduz-se que, após o anúncio do anjo a José explicando-lhe que Maria concebera por obra do Espírito Santo (Mt 1, 20), se casaram e passaram a viver juntos. A narração da fuga e regresso do Egipto, e o estabelecimento em Nazaré (Mt 2, 13-23), bem como o episódio da apresentação do Menino no Templo – quando tinha doze anos, acompanhado pelos seus pais, tal como relata S. Lucas (Lc 2, 41-45) – assim o deixam entender. S. Lucas, além disso, ao narrar a anunciação do anjo a Maria apresenta-a como “uma virgem desposada com um varão chamado José, da casa de David”. Portanto, segundo estes evangelhos, São José esteve casado com a Santíssima Virgem. Este é o dado que pertence com certeza à tradição histórica recolhida nos evangelhos.

Ora bem, se essas foram as segundas núpcias de São José, ou se São José, já ancião e viúvo, não chegou a desposar a Virgem Maria, mas que unicamente cuidou dela como de uma virgem a seu cargo, são coisas que caem no terreno das lendas e que não oferecem qualquer garantia de historicidade.

A primeira menção de tais lendas encontra-se no chamado “Proto-evangelho de S. Tiago”, no séc. II. Conta que Maria permanecia no Templo desde os três anos e que, ao fazer doze anos, os sacerdotes procuraram alguém que tomasse conta dela. Reuniram todos os viúvos da aldeia, e após um sinal prodigioso realizado no bordão de José, que consistiu em que dele saiu uma pomba, entregaram a Virgem à sua guarda. Segundo esta lenda, no entanto, José não tomou Maria por esposa. De facto quando o anjo lhe aparece em sonhos não diz a José como em Mt 1, 20 “não temas receber em tua casa Maria, tua esposa”, mas, antes, “não temas por esta donzela” (XIV, 2). Outro apócrifo mais tardio que rescreve essa história – chamado “Pseudo Mateus”, talvez do séc. VI – parece dar a entender que Maria foi desposada com José, pois o sacerdote diz a este: “deves saber que não pode contrair matrimónio com nenhum outro” (VIII, 4). Contudo, habitualmente, fala de S. José como do guarda da Virgem. Pelo contrário no “Livro do Nascimento de Maria” – uma espécie de resumo do “Pseudo Mateus” – e na “História de José, o carpinteiro” (IV, 4-5), diz-se claramente que José desposou Maria.

Portanto, não há dados históricos que permitam afirmar que São José tivesse sido casado antes. O mais lógico é pensar que fosse um homem jovem quando desposou a Santíssima Virgem, e que só se tenha casado essa vez.


Bibliografia: J. Danielou, Los evangelios de la infancia, Herder, Barcelona 1969; S. Muñoz Iglesias, Los evangelios de la infancia. IV, BAC, Madrid 1990; A. de Santos, Los evangelios apócrifos, BAC, Madrid 1993 (8ª ed.).


6. O que foi a matança dos inocentes? É histórica?

A matança dos inocentes pertence, como o episódio da estrela dos Magos, ao evangelho da infância de S. Mateus. Os Magos tinham perguntado pelo rei dos judeus (Mt 2, 1) e Herodes – que se sabia rei dos judeus – inventa um estratagema, para averiguar quem poderia ser aquele que ele considera um possível usurpador, pedindo aos Magos que o informem quando regressarem. Quando conclui que regressaram por outro caminho, “irou-se em extremo, e mandou matar, em Belém e em todos os seus arredores, todos os meninos de idade de dois anos para baixo, segundo a data que tinha averiguado dos Magos” (Mt 2, 16). A passagem evoca outros episó­dios do Antigo Testamento: também o Faraó tinha mandado matar a todos os recém nascidos dos hebreus, como conta o livro do Êxodo, mas salvou-se Moisés, precisamente aquele que depois libertou o povo (Ex 1, 8-2, 10). S. Mateus diz também, nessa passagem, que com o martírio destes meninos se cumpria um oráculo de Jeremias (Jr 31, 15): o povo de Israel foi desterrado, mas o Senhor tirou-o daí e, num novo êxodo, levou-o à sua terra prometendo-lhe uma nova aliança (Jr 31, 31). Portanto, o sentido da passagem parece claro: por muito que os fortes da terra se empenhem, não se podem opor aos planos que tem Deus para salvar os homens.

É neste contexto que se deve examinar a historicidade do martírio dos meninos inocentes, do qual só temos esta noticia que nos dá S. Mateus. Na lógica da investigação histórica moderna, diz-se que «testis unus testis nullus», um só testemunho não serve. No entanto, é fácil pensar que a matança dos meninos em Belém – uma aldeia de poucos habitantes – não foi muito numerosa e por isso não passou aos anais da história. O que sim é certo, é que a crueldade que manifesta é coerente com as brutalidades que Flávio Josefo nos conta de Herodes: fez afogar o seu cunhado Aristóbulo quando este alcançou grande popularidade (Antiguidades Judaicas, 15 & 54-56); assassinou o seu sogro Hircano II (15, & 174-178), um cunhado, Costobar (15 &247-251) e a sua mulher Marianne (15, &222-239); nos últimos anos da sua vida, mandou matar os seus filhos Alexandre e Aristóbulo (16 &130-135), e cinco dias antes da sua própria morte, outro filho, Antipatro (17 &145); finalmente, ordenou que, perante a sua morte, fossem executados alguns notáveis do reino, para que as gentes da Judeia, querendo-o ou não, chorassem a morte de Herodes (17 &173-175). 


Bibliografia: A. Puig, Jesús. Una biografía, Destino, Barcelona 2005; S. Muñoz Iglesias, Los evangelios de la infancia. IV, BAC, Madrid 1990; J. Danielou, Los evangelios de la infancia, Herder, Barcelona 1969.

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