terça-feira, 6 de dezembro de 2016

Ser Cristão e a sede de Deus


Por que ser cristão? Eis aí uma pergunta que, na maioria das vezes, não encontraremos uma resposta satisfatória a ninguém. Podemos dizer simplesmente que é verdade, tal qual sabemos, baseado numa experiência profunda de amor com Deus. Para aquele que já teve tal experiência, é extremamente simples responder a si mesmo – eu sou amado por Deus, e Ele me Deu a graça de experimentar na minha pele esse amor, por isso o seguirei, e o amarei. Assim, descobrimos que é verdade. Porém, essa resposta muitas vezes serve somente para você; uma terceira pessoa na maioria das vezes não conseguirá compreender a experiência que você teve, nem de acreditar.
É comum se questionar: mas qual o sentido? Qual o objetivo? Existe algum diferencial em ser cristão? Ora, se o cristianismo é verdade, nele não tem outro sentido se não apontar para Deus, ou seja, ele deve nos voltar a Deus. De fato, esse é o sentido último de toda religião: elas consistem em um esforço de se buscar a Deus, pois o homem naturalmente tem sede de Deus.
Todo homem busca a Deus, isso está entranhado na natureza humana, de uma forma ou de outra. Até mesmo ateus buscam a Deus, quando buscam a verdade – eu sou o caminho a verdade e a vida. Os depressivos, buscam a Deus quando procuram algo que alegrem seus corações – Jesus se Apresenta como fonte de alegria (Jo 16, 22; Jo 20, 20). Então, há uma sede natural no homem que, de alguma forma, o impele na busca de Deus.
Tal busca se revela, de maneira muito mais intensa nas famosas peregrinações: quantas pessoas saem pelo mundo, viajando, em busca de algo que as satisfaça essa sede interior.
Porém, se toda religião é uma busca de Deus, o que torna o cristianismo tão especial? Que diferença ser cristão faz em você? Uma verdade científica nos leva a produzir coisas que mostram que aquele pensamento é verdadeiro, pois levam a algum impacto ao mundo, possuem implicações na maneira que vivemos e de como vemos o mundo; por exemplo, a teoria mecânica de fluidos nos permitir produzir aviões, ou prever o movimento das correntes marítimas. Isso nos leva a clara meditação de que o cristianismo deve fazer alguma diferença no mundo, se não o faz, como saberemos então que é verdadeiro?
Há aqui um perigo: se nos fecharmos apenas na questão utilitária da religião, acabaremos por incorrer no erro de transformá-la em uma ferramenta útil, transformar em propaganda; se, por exemplo, for descoberto que os cristãos são mais calmos que as pessoas de outras religiões, cair no erro de transformar o cristianismo em uma ferramenta que visa apenas tornar as pessoas mais calmas, um acessório, como um aroma terapia ou ginástica. Porém, se a pessoa que vive esta fé se torna um exemplo que leva as pessoas a observarem algo de diferente, uma alegria mais profunda, uma serenidade e calma diante das situações mais conflitantes, então ela causa um impacto, especialmente naquelas que não são cristãs: existe ali algo que é verdadeiro. Não é como se eu fosse dizer “Seja cristão e seja mais alegre”, mas, se as pessoas de fora vissem essa alegria nos cristãos, seriam levadas a questionar: “O que existe aqui, que
leva essas pessoas a serem tão alegres?” e então se interessar por Deus e por nossa religião.
Por exemplo, no velório da avó de Andrei, lá na casa da comunidade, em que algumas pessoas questionavam: “nunca vi um velório assim” havia ali dor, da saudade, daquele que foi, mas Andrei dizia “compreendam, que isto aqui não é um momento de tristeza, mas de alegria, com lágrimas, mas de profunda alegria”. E isto era tão aparente, que muitos se impressionavam como aquele velório aconteceu. Por nossa esperança na vida eterna e em Deus, somos capazes de até mesmo nos momentos de grande dor, paradoxalmente, expressar grande alegria, e essa alegria é sentida por aqueles que estão ao nosso redor.
O Cardeal Suhard, arcebispo de Paris na década de 1940, escreveu: “ser testemunha não é fazer propaganda, nem sequer agitar as pessoas, mas em ser um mistério vivo. Significa viver de tal modo, que a vida sem Deus não teria sentido”
Um cristão anônimo também escreveu: “Os cristãos não se distinguem dos demais homens nem pela nacionalidade, nem pela língua, nem pelos costumes. Nem em parte alguma habitam em cidades peculiares, nem usam uma língua distinta, nem vivem uma vida singular. Nem uma doutrina desta natureza deve a sua descoberta a invenção e conjectura de homens de espírito irrequieto, nem defendem como alguns, uma doutrina humana. Habitando cidades Gregas e barbaras conforme coube em sorte a cada um e seguindo os usos e costumes das regiões, no vestuário, no regime alimentar e no resto da vida, revelam unanimemente uma maravilhosa e paradoxal constituição do seu regime de vida político social. Habitam pátrias próprias, mas como peregrinos, participam de tudo como cidadãos, e tudo suportam como estrangeiros”
Assim, completa-se a ideia de que há algo de inegavelmente diferente nos cristãos, que leva aos outros a interrogarem-se, a questionarem-se sobre as nossas vidas.
Um amigo costuma muito dizer que a evangelização não é um convencimento, e tomo por minha própria experiência que o debate pouco ou nada ajuda nessa questão. Muito mais eficaz é quando nossa vida reflete aquilo que cremos e leva o outro a observar essas diferenças e buscar conhecer o que me traz essas características que são atraentes “muito mais que um processo de convencimento, a evangelização é um processo de contagio, em que não sou eu que questiono a vida do meu irmão, mas a minha vida que questiona a vida dele”.
Mas não se trata, porém, de “eu sou cristão, agora tenho que viver sorrindo, não posso mais isso não posso mais demonstrar aquilo” não, nada disso. Uma comunidade que fundasse sua existência em um sentimento de superioridade moral, se tornaria totalmente repulsiva e levaria todos a buscarem o menor defeito possível para acusá-la. Não, não se trata disso, Jesus mesmo disse: “foi aos pecadores que eu vim”. Assim, ser cristão, é reconhecer-se pecador, miserável e dependente da misericórdia de Deus. Assim, torna-se impossível rechaçar o outro por sua fraqueza, pois você reconhece, na do seu irmão, a sua própria fraqueza. Ser cristão antes, é caminhar na verdade, reconhecer quem você é, e viver como você é. Santa Teresa d’ávila costumava dizer, que a humildade é caminhar na verdade, na verdade de que você é um nada, ou seja: somos nada. Mas, se parássemos por aí, antes isso nos seria fonte de grande tristeza e desespero: não somos nada, somos pecadores miseráveis, indignos do mais medíocre dos méritos. Mas eis aí a fonte da nossa alegria: temos a esperança num Deus que é capaz, de até mesmo esse nada, transformar em tudo! E dar sentido a esse nada que nós somos.
A alegria cristã surge não de uma situação forçada, mas de uma esperança e uma convicção de que tudo aponta para o alto: ou seja, a um sentido em todas as coisas, e é nessa esperança que se baseia nossa alegria. Uma esperança, enfim, que nos leva a Deus. Um Deus que, mesmo sendo nós miseráveis e não merecendo dele um vintém, Ele nos ama, e nos leva até Ele. Esse é o sentido de ser um cristão. É a nossa fé que sacia àquela sede original de algo que dê sentido a nossa vida e a nossa existência, apontando nossas vidas para um fim último que é a união com Cristo.

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